Polinizando ideias: Botero, o renascimento colombiano

 
Fernando Botero, artista plástico colombiano nascido em Medellín, é conhecido mundialmente por suas figuras, em telas ou esculturas, que esbanjam centímetros por todos os lados. Na região onde nasceu, em 1932, não havia museus ou tradição de pintores, então foi descobrindo sozinho o que seria fazer arte.
 
Ele alimentou sua inspiração em diversas fontes, desde obras pré-colombianas, passando pela arte popular da América Latina, até a inspiração definitiva dada pelas obras italianas dos séculos 14 e 15. Neste período, Botero encontrou os excessos, os volumes que até hoje iluminam os olhares de todos os apreciadores de arte, mesmo nos tempos contemporâneos de culto à magreza.
 
Buscou aprimoramento por meio do autodesenvolvimento. Aos 19 anos, passou um tempo em Madrid, fazendo cópias de obras do Museu Del Prado, para conseguir dinheiro para viver e experiência para se desenvolver. Passou dois anos em Florença, copiando afrescos e tomando contato com as obras que tinham o caráter plástico e volumétrico que o influenciaram fortemente, advindos do renascimento italiano. Depois morou em Nova Iorque, onde o forte naquele momento era a pintura abstrata e, portanto, muito diferente da sua escolha artística.
 
Botero escolheu ser um artista independente. Livre das amarras das tendências e modismos, fazendo uma pintura em que acreditava. Ele disse: “É claro que esta atitude provocou todo tipo de resistências. Mas insisti em meu ponto de vista, mesmo contra a corrente, porque estou convencido de que a arte é uma expressão muito pessoal do que o artista tem dentro de si, e que cada um tem que buscar o frescor e a originalidade interiores. Assim, consegui fazer uma obra que atualmente tem uma grande aceitação.”
 
Sua obra, que mescla tantas referências, porém é completamente única e identificável, inspira a reflexão de que, sim, é preciso que aqueles que queiram fazer diferença em qualquer campo e não apenas no artístico, também devem beber em muitas fontes, não para fazer cópias, mas sim produzir algo único e significativo para o seu trabalho e para sua vida. Como ele diz, buscar o frescor e a originalidade dentro de si, para fazer o que quer e o que vale a pena ser feito.

Polinizando ideias: A genialidade em comunhão de Ezio Bosso

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Palco do passeio público, dos músicos, da história, da arte, da arquitetura e fé, essa semana a Piazza Maggiore de Bologna-Italia se transformou em uma gigantesca sala de concerto ao ar livre, dedicado aos encontros do G7 sobre meio ambiente, que será realizado este mês na capital romagnola. A transmissão do concerto foi realizada na tela mais larga da Europa, alimentada através de energia de painéis solares.

A Orchestra del Teatro Comunale di Bologna foi regida pelo italiano Ezio Bosso, maestro, compositor contrabaixista e pianista. Um músico prodígio, autor de cinco sinfonias, concertos, peças para ballet, cinema, teatro, além de inúmeras peças de câmara e solo. Tudo isso já seria fora do normal para um ser humano comum. Ezio Bosso carrega o peso de uma enfermidade terrível, a esclerose lateral amiotrófica (ELA), que vem lhe acometendo os movimentos desde 2011. No meio do processo, um tumor foi retirado do seu cérebro, que segundo ele acelerou todos os seus problemas com a esclerose. Após a cirurgia, Ezio precisou reaprender a tocar todos os instrumentos.

No entanto, a enfermidade em nada afeta sua criatividade, talento e empatia com o público. Ezio fala com dificuldade, que logo se transforma em leveza e transmissão de belos pensamentos e reflexões pontuais. Quando toca e rege a orquestra, o faz com um enorme sorriso, que parece envolver suas dores. De seu esforço descomunal, a música flui solta, como palavras que acariciam o silêncio. Em nenhum momento discorre sobre suas dificuldades ou se lamenta de qualquer coisa, sua atenção é toda voltada para a comunhão musical e filosófica.

O programa dedicado ao meio ambiente, se encerra com a Sinfonia Inacabada de Schubert, que segundo Bosso, é uma das peças mais belas da música. Fazendo alusão ao tema ambiental, a peça que ficou por tanto tempo guardada na gaveta, vive e revive cada vez que é interpretada, mesmo que esteja incompleta. Ao encerrar a sinfonia no segundo o movimento, ao invés dos quatro habituais, o ouvinte leva para si um poema em aberto. Para transformar, reciclar e (re)viver.

“A musica é como o sorriso. Um sorriso talvez não mude uma vida, mas pode mudar um momento e aquele momento, todo um dia. Um dia pode transformar a vida de uma pessoa.”

Ezio Bosso

Site: www.eziobosso.com
Escute: Following a bird [The 12th room]: goo.gl/4cdziw

Foto: Riccardo Savi

Polinizando ideias: As formas de Brecheret e a imigração

brecheret

 

Polinizando ideias: As formas de Brecheret e a imigração

A mãe do pequeno Vittorio faleceu quando ele tinha apenas 6 anos. Acolhido pela família do tio materno, imigrou com eles para o Brasil em 1904, buscando uma vida melhor que na sofrida Itália daqueles tempos.

Foram acolhidos pela cidade de São Paulo, que estava em pujante crescimento impulsionado pelo café. O menino Vittorio, no Brasil, tornou-se Victor Brecheret, preservando o sobrenome do pai.

Estudou entalhe em madeira e mármore no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. Depois passou 5 anos em Roma aperfeiçoando sua arte. Voltou ao Brasil e integrou-se ao movimento modernista, expondo algumas de suas obras no terraço do Teatro Municipal de São Paulo, durante a importante Semana de Arte Moderna de 1922.

Suas obras podem ser vistas nos mais diversos locais da cidade de São Paulo e em vários lugares do mundo. Seu trabalho mais conhecido, o Monumento às Bandeiras, inaugurado em 1953, levou 30 anos para ser concluído e tem dimensões colossais. Homenageia não apenas os bandeirantes paulistas, mas todo o povo brasileiro. O escultor recebeu prêmios e honrarias no Brasil e na Europa.

A escultura tem essa concretude que outras artes não possuem. As obras de Brecheret, com seus traços limpos e fortes, atraem não apenas o olhar, mas também a interação física das pessoas.

Nestes duros tempos de imigrantes deslocando-se e sofrendo pelo mundo, é importante relembrar a contribuição do menino italiano à arte brasileira. Ele, apesar da vitoriosa carreira internacional, fez questão de buscar e receber a cidadania brasileira como homenagem e gratidão ao país que o acolheu.

Victor Brecheret
http://www.victor.brecheret.nom.br

Foto: Divulgação

Polinizando ideias: O toque de mestre de Paolo Sorrentino

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O mais recente filme do diretor italiano Paolo Sorrentino é um encadeado de temas tão delicados quanto profundos e que estão presentes na vida de cada um e de todos: a amizade, a velhice, a juventude, o sofrimento, a beleza, a raiva, o amor, as lembranças, o futuro, o aprendizado, o reconhecimento, a injustiça, a fragilidade da fama de artistas ou de atletas, a declaração de amor muito além das palavras, o recomeço, a saúde.

Fiquemos aqui, com apenas uma gota do filme, aquela que trata do aprendizado:

Um menino, dedicado estudante de violino, repete várias vezes as notas de uma canção. Um famoso maestro está nas proximidades e acaba por procurá-lo. Pergunta por que está interpretando aquela canção e o menino responde que o seu professor disse que ela seria muito útil para ele, que era um iniciante. O compositor confirma que o professor estava certo, afinal, seu nome é Canção Simples, devido à sua real simplicidade. O menino diz:

“Ela não é apenas simples, ela é muito bela.”

O maestro apresenta-se como sendo o compositor da música e pede licença para reposicionar o braço do pequeno violinista, apenas alguns centímetros acima. No dia seguinte, o menino procura o maestro e lhe diz que aquela pequena correção fez grande diferença no seu desempenho com o violino e então lhe agradece.

O maestro diz que o fato de ele ser canhoto faz com que o que é perfeito para um destro, pode não apresentar os melhores resultados para um canhoto, por isso o posicionamento aconselhado foi um pouco fora do padrão.

E assim, a cena nos faz pensar e repensar em momentos de grandes aprendizados, causados por pequenas mudanças que alguém, sábio e gentil, ofereceu e alguém sedento por aprender, aceitou e aplicou.

Além das muitas reflexões que este filme pode provocar, ele traz alguns momentos tão sublimes em termos de beleza cênica, que o que basta é senti-los plenamente, mergulhando na doçura ou força onírica da imagens e da trilha sonora criativa.

Talvez, para alguns espectadores, a sutileza e fragmentação com que Paolo Sorrentino trata de tantos aspectos da vida humana, poderá soar como superficialidade. Mas para aqueles, que por sorte, por amor, por dor ou por entrega plena ao filme se conectarem plenamente à forma com que ele os apresentou, poderá ter um momento de raro prazer ou belo aprendizado.

Filme: A Juventude
Título Original: La Giovinezza
Direção: Paolo Sorrentino
Com: Michael Caine, Harvey Keitel, Rachel Weisz
País: Itália
Ano: 2015

Polinizando ideias: Ítalo Calvino e as Fábulas Italianas

calvino

Ítalo Calvino (1923-1985) é um escritor italiano que nasceu na cidade de Santiago de Las Vegas em Cuba, mas foi para a Itália muito pequeno. Ele é considerado um dos maiores escritores europeus do Século XX, mas quando ainda não era muito conhecido, recebeu uma encomenda curiosa e relevante: compilar as fábulas italianas, assim como já haviam feito os Irmãos Grimm com as fábulas alemãs no século XIX. Esta obra recebeu no Brasil o Prêmio Jabuti 1993, na categoria de melhor produção editorial em obra coleção.

A fábula é uma alegoria espontânea, que nasceu praticamente em paralelo à linguagem do ser humano e permitiu que ideias abstratas se transformassem em histórias instrutivas e divertidas e, talvez, tenha sido a primeira forma de reflexão sobre valores morais.

No livro, Calvino registra a cidade ou região italiana de onde cada uma das fábulas foi trazida, enriquecendo ainda mais seu conteúdo. A narrativa sempre rica em elementos diversos, como castelos, príncipes e princesas, seres mitológicos, criaturas incríveis, bruxas, fadas, pessoinhas ou gigantes cheios de ação, faz sua leitura ser fácil e leve. Claro que a interpretação pode ter profundos nuances psicológicos ou morais e esse é outro ganho possível desta compilação, que foi modulada pela beleza e maestria com que Ítalo Calvino escreve.

Nestes tempos, distanciadoramente digitais, ler estas fábulas com a família ou amigos pode ser um momento de boa aproximação, de diversão sadia e um remexer na criatividade e no pensar sobre o justo, que é um dos elementos que se abstrai de uma fábula.

Livro: Fábulas Italianas
Autor: Ítalo Calvino:
Editora: Companhia das Letras

Para quem quiser ler pelo menos duas destas fábulas de Ítalo Calvino, acesse este site de domínio público: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me001614.pdf

Polinizando ideias: O legado de Canaletto

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Muitas vezes se ouve a pergunta que cutuca e alavanca: Qual o seu legado? Poucos profissionais têm o legado tão explícito quanto os grandes pintores. Nas telas deixam seu espírito e seu coração prontos a tocar, inspirar e sacudir as emoções de quem lhes dedica o olhar atencioso e a alma revolta.

O pintor italiano Canaletto (Giovanni Antonio Canale), nascido e morto em Veneza (1697-1768) é um desses grandes ícones da pintura mundial e deixou como legado a vida pulsante de Veneza, Roma e Londres em pinturas que são como retratos precisos e fortes, antecipando o que somente foi possível no próximo século, com o advento da fotografia.

Seus detalhes, que tendem à reprodução perfeita, permitem vislumbrar não apenas a arquitetura da época, mas também a moda, os costumes e as festas de forma vivaz. Observar uma de suas obras é um exercício sensorial intenso e único, que nos convida a mergulhar naquele que é um antigo e um novo mundo pincelado em cada uma de suas nuances.

A tela de Canaletto recebe as paisagens urbanas em um movimento da pintura chamado de vedutismo, já que em italiano “La Veduta” significa “A vista da cidade”. Essa era uma forma de pintar que era novidade para os tempos do Século XVIII, especialmente nos aspectos de perspectiva, pois mostrava as cidades de ângulos até então inusitados e com uma profundidade ainda não experimentada nesse grau de qualidade até então. Em uma tela plana, 2D, vemos a realidade com tanta profundidade quanto se estivéssemos a contemplá-la no ambiente real. Se hoje em dia colocamos uma pintura de Canaletto contraposta a uma fotografia de um local retratado por ele e que se manteve preservado, como o Arco de Constantino de Roma, por exemplo, podemos ver que a paixão por detalhes, apesar de passados 3 séculos, é de impressionar qualquer retina e suas formas, luzes e cores fazem vibrar o coração.

A arte tem poder de expandir o pensamento, de fazer ver novas perspectivas, de nos fazer verdadeiramente humanos, já que é o verdadeiro e necessário diferencial desta nossa raça tão conturbada.

Polinizando Ideias: A Cúpula de Florença

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Florença é uma das mais belas e mais visitadas cidades do mundo. Certamente esta importante cidade italiana não seria a mesma se em 1419, o projeto vencedor para a construção da Cúpula da Catedral de Florença, Santa Maria del Fiore, não fosse de Filippo Brunelleschi.

O incrível que até hoje, tantos séculos e tecnologia depois, esta continua sendo a maior cúpula em alvenaria já construída.

A cúpula está em perfeito estado de conservação e beleza, mas dos projetos de sua construção e montagem não restaram vestígios, assim não se sabe como ela foi feita. O que parece convergente é que Brunelleschi deve ter construído a cúpula utilizando algum sistema inédito e absolutamente inovador de pré-construção. Isto é, a cúpula foi construída em partes, no chão, e montada no alto, para iluminar a linha do horizonte de Florença por muitos séculos. Se assim foi, este foi o primeiro sistema pré-moldado do mundo. Para levar os materiais e módulo para cima ele inventou os bisavós das atuais gruas. Seu sonho fez com que arrumasse solução para todos os problemas.

Esta cúpula ilumina também o pensamento sobre quanto o cuidado genuíno com a beleza e com o esmero podem tornar a vida e a obra de uma pessoa perenes e relevantes.

Para saber mais, veja este vídeo sobre a Cúpula de Brunelleschi: bit.ly/1Q2tW8X

Foto: Marli Gavioli