itália
Polinizando ideias: A genialidade em comunhão de Ezio Bosso
Palco do passeio público, dos músicos, da história, da arte, da arquitetura e fé, essa semana a Piazza Maggiore de Bologna-Italia se transformou em uma gigantesca sala de concerto ao ar livre, dedicado aos encontros do G7 sobre meio ambiente, que será realizado este mês na capital romagnola. A transmissão do concerto foi realizada na tela mais larga da Europa, alimentada através de energia de painéis solares.
A Orchestra del Teatro Comunale di Bologna foi regida pelo italiano Ezio Bosso, maestro, compositor contrabaixista e pianista. Um músico prodígio, autor de cinco sinfonias, concertos, peças para ballet, cinema, teatro, além de inúmeras peças de câmara e solo. Tudo isso já seria fora do normal para um ser humano comum. Ezio Bosso carrega o peso de uma enfermidade terrível, a esclerose lateral amiotrófica (ELA), que vem lhe acometendo os movimentos desde 2011. No meio do processo, um tumor foi retirado do seu cérebro, que segundo ele acelerou todos os seus problemas com a esclerose. Após a cirurgia, Ezio precisou reaprender a tocar todos os instrumentos.
No entanto, a enfermidade em nada afeta sua criatividade, talento e empatia com o público. Ezio fala com dificuldade, que logo se transforma em leveza e transmissão de belos pensamentos e reflexões pontuais. Quando toca e rege a orquestra, o faz com um enorme sorriso, que parece envolver suas dores. De seu esforço descomunal, a música flui solta, como palavras que acariciam o silêncio. Em nenhum momento discorre sobre suas dificuldades ou se lamenta de qualquer coisa, sua atenção é toda voltada para a comunhão musical e filosófica.
O programa dedicado ao meio ambiente, se encerra com a Sinfonia Inacabada de Schubert, que segundo Bosso, é uma das peças mais belas da música. Fazendo alusão ao tema ambiental, a peça que ficou por tanto tempo guardada na gaveta, vive e revive cada vez que é interpretada, mesmo que esteja incompleta. Ao encerrar a sinfonia no segundo o movimento, ao invés dos quatro habituais, o ouvinte leva para si um poema em aberto. Para transformar, reciclar e (re)viver.
“A musica é como o sorriso. Um sorriso talvez não mude uma vida, mas pode mudar um momento e aquele momento, todo um dia. Um dia pode transformar a vida de uma pessoa.”
Site: www.eziobosso.com
Escute: Following a bird [The 12th room]: goo.gl/4cdziw
Foto: Riccardo Savi
Polinizando ideias: As formas de Brecheret e a imigração
Polinizando ideias: As formas de Brecheret e a imigração
A mãe do pequeno Vittorio faleceu quando ele tinha apenas 6 anos. Acolhido pela família do tio materno, imigrou com eles para o Brasil em 1904, buscando uma vida melhor que na sofrida Itália daqueles tempos.
Foram acolhidos pela cidade de São Paulo, que estava em pujante crescimento impulsionado pelo café. O menino Vittorio, no Brasil, tornou-se Victor Brecheret, preservando o sobrenome do pai.
Estudou entalhe em madeira e mármore no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. Depois passou 5 anos em Roma aperfeiçoando sua arte. Voltou ao Brasil e integrou-se ao movimento modernista, expondo algumas de suas obras no terraço do Teatro Municipal de São Paulo, durante a importante Semana de Arte Moderna de 1922.
Suas obras podem ser vistas nos mais diversos locais da cidade de São Paulo e em vários lugares do mundo. Seu trabalho mais conhecido, o Monumento às Bandeiras, inaugurado em 1953, levou 30 anos para ser concluído e tem dimensões colossais. Homenageia não apenas os bandeirantes paulistas, mas todo o povo brasileiro. O escultor recebeu prêmios e honrarias no Brasil e na Europa.
A escultura tem essa concretude que outras artes não possuem. As obras de Brecheret, com seus traços limpos e fortes, atraem não apenas o olhar, mas também a interação física das pessoas.
Nestes duros tempos de imigrantes deslocando-se e sofrendo pelo mundo, é importante relembrar a contribuição do menino italiano à arte brasileira. Ele, apesar da vitoriosa carreira internacional, fez questão de buscar e receber a cidadania brasileira como homenagem e gratidão ao país que o acolheu.
Victor Brecheret
http://www.victor.brecheret.nom.br
Foto: Divulgação
Polinizando ideias: O toque de mestre de Paolo Sorrentino
O mais recente filme do diretor italiano Paolo Sorrentino é um encadeado de temas tão delicados quanto profundos e que estão presentes na vida de cada um e de todos: a amizade, a velhice, a juventude, o sofrimento, a beleza, a raiva, o amor, as lembranças, o futuro, o aprendizado, o reconhecimento, a injustiça, a fragilidade da fama de artistas ou de atletas, a declaração de amor muito além das palavras, o recomeço, a saúde.
Fiquemos aqui, com apenas uma gota do filme, aquela que trata do aprendizado:
Um menino, dedicado estudante de violino, repete várias vezes as notas de uma canção. Um famoso maestro está nas proximidades e acaba por procurá-lo. Pergunta por que está interpretando aquela canção e o menino responde que o seu professor disse que ela seria muito útil para ele, que era um iniciante. O compositor confirma que o professor estava certo, afinal, seu nome é Canção Simples, devido à sua real simplicidade. O menino diz:
“Ela não é apenas simples, ela é muito bela.”
O maestro apresenta-se como sendo o compositor da música e pede licença para reposicionar o braço do pequeno violinista, apenas alguns centímetros acima. No dia seguinte, o menino procura o maestro e lhe diz que aquela pequena correção fez grande diferença no seu desempenho com o violino e então lhe agradece.
O maestro diz que o fato de ele ser canhoto faz com que o que é perfeito para um destro, pode não apresentar os melhores resultados para um canhoto, por isso o posicionamento aconselhado foi um pouco fora do padrão.
E assim, a cena nos faz pensar e repensar em momentos de grandes aprendizados, causados por pequenas mudanças que alguém, sábio e gentil, ofereceu e alguém sedento por aprender, aceitou e aplicou.
Além das muitas reflexões que este filme pode provocar, ele traz alguns momentos tão sublimes em termos de beleza cênica, que o que basta é senti-los plenamente, mergulhando na doçura ou força onírica da imagens e da trilha sonora criativa.
Talvez, para alguns espectadores, a sutileza e fragmentação com que Paolo Sorrentino trata de tantos aspectos da vida humana, poderá soar como superficialidade. Mas para aqueles, que por sorte, por amor, por dor ou por entrega plena ao filme se conectarem plenamente à forma com que ele os apresentou, poderá ter um momento de raro prazer ou belo aprendizado.
Filme: A Juventude
Título Original: La Giovinezza
Direção: Paolo Sorrentino
Com: Michael Caine, Harvey Keitel, Rachel Weisz
País: Itália
Ano: 2015
Polinizando ideias com: Ecco!
Ecco em italiano pode significar “aqui está” e também “bravo!” ou “é isso!”. Qualquer uma dessas expressões fica bem se aplicada a Humberto Eco (1932-2016), que desde sua primeira obra assombrou o mundo tanto por sua erudição – ele foi escritor, semiólogo, bibliófilo, linguista, colunista e filósofo – quanto por sua capacidade de colocar luzes e matizes na sombria idade média com seus estudos sobre Tomaz de Aquino e seu romance ‘O Nome da Rosa’, dentre outros.
Ele, não há quem possa discordar, influenciou o mundo das letras e, mais que isso, mexeu com aqueles que apenas conheceram algumas de suas frases pensantes. Por exemplo, esta reflexão extraída de seu livro ‘O pêndulo de Foucault’: “Eu acredito que o que nos tornamos depende do que nossos pais nos ensinam em momentos estranhos, quando eles não estão tentando nos ensinar. Somos formados por pequenos pedaços de sabedoria.”
A arte, quando é capaz de ser este pequeno pedaço de sabedoria que influencia e transforma para melhor ao menos um único ser humano, vale todo o esforço e, por vezes, sofrimento da criação.
Quando você está agindo naturalmente, sendo autêntico e dando bons passos em prol de algo que valha a pena, estará colocando em ação sua maior capacidade de influenciar seus filhos, amigos e quem trabalha com você ou quem toma contato com sua ação ou com o resultado dela. É o seu exemplo que mostra, na verdade, aquilo em que você acredita.
Outra frase de Humberto Eco, extraída do livro ‘A ilha do dia anterior’, diz: “As histórias que eu gostaria de escrever me perseguem. Quando estou no meu quarto, parece que estão à minha volta, como diabinhos, e enquanto um puxa minha orelha, outro aperta meu nariz, e cada um me diz: “senhor, escreva-me, eu sou bonita.” Os diabinhos atendidos e transformados por Eco em romances ou ensaios estão à nossa disposição para ler, esmiuçar, criticar, gostar, odiar e, mais que tudo refletir e aprender a aprender.
A leitura aguça a criatividade e desenvolve o aprendizado da capacidade de refletir e analisar. As empresas que avançam no campo da cultura, possibilitando debates enriquecedores em todos os seus níveis, avançam em seus necessários resultados, mas não a qualquer preço, não a qualquer custo.
Um de seus últimos atos, seguindo sua consciência de não fazer as coisas a qualquer preço, foi a criação de uma nova editora com o nome ‘La nave di Teseo’. A decisão aconteceu em novembro de 2015, quando a editora italiana Bompiani, que publicou a maior parte da obra de Eco, foi vendida para um conglomerado controlado pela família do ex-primeiro ministro Silvio Berlusconi.
Ecco!
Polinizando ideias: Ítalo Calvino e as Fábulas Italianas

Ítalo Calvino (1923-1985) é um escritor italiano que nasceu na cidade de Santiago de Las Vegas em Cuba, mas foi para a Itália muito pequeno. Ele é considerado um dos maiores escritores europeus do Século XX, mas quando ainda não era muito conhecido, recebeu uma encomenda curiosa e relevante: compilar as fábulas italianas, assim como já haviam feito os Irmãos Grimm com as fábulas alemãs no século XIX. Esta obra recebeu no Brasil o Prêmio Jabuti 1993, na categoria de melhor produção editorial em obra coleção.
A fábula é uma alegoria espontânea, que nasceu praticamente em paralelo à linguagem do ser humano e permitiu que ideias abstratas se transformassem em histórias instrutivas e divertidas e, talvez, tenha sido a primeira forma de reflexão sobre valores morais.
No livro, Calvino registra a cidade ou região italiana de onde cada uma das fábulas foi trazida, enriquecendo ainda mais seu conteúdo. A narrativa sempre rica em elementos diversos, como castelos, príncipes e princesas, seres mitológicos, criaturas incríveis, bruxas, fadas, pessoinhas ou gigantes cheios de ação, faz sua leitura ser fácil e leve. Claro que a interpretação pode ter profundos nuances psicológicos ou morais e esse é outro ganho possível desta compilação, que foi modulada pela beleza e maestria com que Ítalo Calvino escreve.
Nestes tempos, distanciadoramente digitais, ler estas fábulas com a família ou amigos pode ser um momento de boa aproximação, de diversão sadia e um remexer na criatividade e no pensar sobre o justo, que é um dos elementos que se abstrai de uma fábula.
Livro: Fábulas Italianas
Autor: Ítalo Calvino:
Editora: Companhia das Letras
Para quem quiser ler pelo menos duas destas fábulas de Ítalo Calvino, acesse este site de domínio público: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me001614.pdf
Polinizando ideias: O legado de Canaletto
Muitas vezes se ouve a pergunta que cutuca e alavanca: Qual o seu legado? Poucos profissionais têm o legado tão explícito quanto os grandes pintores. Nas telas deixam seu espírito e seu coração prontos a tocar, inspirar e sacudir as emoções de quem lhes dedica o olhar atencioso e a alma revolta.
O pintor italiano Canaletto (Giovanni Antonio Canale), nascido e morto em Veneza (1697-1768) é um desses grandes ícones da pintura mundial e deixou como legado a vida pulsante de Veneza, Roma e Londres em pinturas que são como retratos precisos e fortes, antecipando o que somente foi possível no próximo século, com o advento da fotografia.
Seus detalhes, que tendem à reprodução perfeita, permitem vislumbrar não apenas a arquitetura da época, mas também a moda, os costumes e as festas de forma vivaz. Observar uma de suas obras é um exercício sensorial intenso e único, que nos convida a mergulhar naquele que é um antigo e um novo mundo pincelado em cada uma de suas nuances.
A tela de Canaletto recebe as paisagens urbanas em um movimento da pintura chamado de vedutismo, já que em italiano “La Veduta” significa “A vista da cidade”. Essa era uma forma de pintar que era novidade para os tempos do Século XVIII, especialmente nos aspectos de perspectiva, pois mostrava as cidades de ângulos até então inusitados e com uma profundidade ainda não experimentada nesse grau de qualidade até então. Em uma tela plana, 2D, vemos a realidade com tanta profundidade quanto se estivéssemos a contemplá-la no ambiente real. Se hoje em dia colocamos uma pintura de Canaletto contraposta a uma fotografia de um local retratado por ele e que se manteve preservado, como o Arco de Constantino de Roma, por exemplo, podemos ver que a paixão por detalhes, apesar de passados 3 séculos, é de impressionar qualquer retina e suas formas, luzes e cores fazem vibrar o coração.
A arte tem poder de expandir o pensamento, de fazer ver novas perspectivas, de nos fazer verdadeiramente humanos, já que é o verdadeiro e necessário diferencial desta nossa raça tão conturbada.
Polinizando Ideias: A Cúpula de Florença
Florença é uma das mais belas e mais visitadas cidades do mundo. Certamente esta importante cidade italiana não seria a mesma se em 1419, o projeto vencedor para a construção da Cúpula da Catedral de Florença, Santa Maria del Fiore, não fosse de Filippo Brunelleschi.
O incrível que até hoje, tantos séculos e tecnologia depois, esta continua sendo a maior cúpula em alvenaria já construída.
A cúpula está em perfeito estado de conservação e beleza, mas dos projetos de sua construção e montagem não restaram vestígios, assim não se sabe como ela foi feita. O que parece convergente é que Brunelleschi deve ter construído a cúpula utilizando algum sistema inédito e absolutamente inovador de pré-construção. Isto é, a cúpula foi construída em partes, no chão, e montada no alto, para iluminar a linha do horizonte de Florença por muitos séculos. Se assim foi, este foi o primeiro sistema pré-moldado do mundo. Para levar os materiais e módulo para cima ele inventou os bisavós das atuais gruas. Seu sonho fez com que arrumasse solução para todos os problemas.
Esta cúpula ilumina também o pensamento sobre quanto o cuidado genuíno com a beleza e com o esmero podem tornar a vida e a obra de uma pessoa perenes e relevantes.
Para saber mais, veja este vídeo sobre a Cúpula de Brunelleschi: bit.ly/1Q2tW8X
Foto: Marli Gavioli