Polinizando ideias: Pedaços de delicadezas

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Louvor da Sombra
é um pequeno livro (menos de 50 páginas) escrito em 1933 por Junichiro Tanizaki e que provoca debates há muitas décadas. Os críticos e estudiosos não chegaram a um resultado comum em sua análise. Enquanto alguns percebem este seu texto como uma belíssima descrição de como é o gosto estético do autor em relação às modernidades ocidentais versus a tradição japonesa, outros veem na obra uma paródia muito bem escrita e não uma defesa do estilo de tradição genuinamente japonês na arquitetura e costumes.
 
Algumas de suas passagens podem proporcionar ao apreciador de literatura um grande prazer, como a que descreve o papel japonês em comparação ao papel ocidental:
 
“O papel, segundo ouvi dizer, foi inventado pelos chineses, e para nós, os japoneses, o papel ocidental nada mais é que uma utilidade; já o aspecto e a textura do papel japonês (washi) ou do chinês (toushi) nos proporcionam sensação de tépido aconchego e paz de espírito. Além disso, a brancura do papel ocidental difere da do papel japonês especial (housho), ou da do papel chinês branco (hakutoushi). A textura do papel ocidental tende a repelir a luminosidade, mas tanto o housho como o hakutoushi têm textura suave semelhante à da macia primeira neve de inverno e, como ela, absorve brandamente a luz. Bastante maleável, não produz ruído ao ser dobrado ou amassado. Manuseá-lo é o mesmo que tocar em folhas de árvores frescas e úmidas.”
 
Escrever é despertar a imaginação. É levar o leitor a caminhar e sentir outro mundo. Quando se consegue ao descrever uma simples folha de papel, exprimir em palavras algo que mexe com vários sentidos como a visão e o tato (primeira neve de inverno), a audição, o tato e o olfato (Não produz ruído…é o mesmo que tocar em folhas frescas e úmidas) e outras sensações (tépido aconchego e paz de espírito), se envolve o leitor neste papel de uma tal forma que ele também quer tocar e dobrar o washi e ter suas próprias sensações.
 
Saindo desta poética competência e retornando ao mundo das organizações, tal é a revolução pela qual o mundo está passando em termos de produtos e serviços que se a empresa não consegue despertar no seu cliente e na sua equipe sensações boas que proporcionem momentos inesquecíveis, certamente ele a trocará, assim que possível, por outra que o ajude a sentir e a viver com mais intensidade ou com nuances que despertem sentidos e sensações que ajudem a vida a ser, pelo menos, mais prazerosa.
 
Livro: Em Louvor da Sombra
Autor: Junichiro Tanizaki
Editora: Penguin – Companhia das Letras

Arte sobre imagem
Obra: Folding Screen with Design of Plum Tree
Escola Rin
Período Edo
Tokyo Fuji Art Museum

Polinizando ideias: Escolhas que fazem toda a diferença

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Para nossa polinização de hoje, escolhemos um poema do americano Robert Frost que, se lido com a atenção e a escuta atentas, poderá produzir belos frutos.

A estrada não trilhada
Robert Frost (1874 – 1963)

Num bosque, em pleno outono, a estrada bifurcou-se,
mas, sendo um só, só um caminho eu tomaria.
Assim, por longo tempo eu ali me detive,
e um deles observei até um longe declive
no qual, dobrando, desaparecia…

Porém tomei o outro, igualmente viável,
e tendo mesmo um atrativo especial,
pois mais ramos possuía e talvez mais capim,
embora, quanto a isso, o caminhar, no fim,
os tivesse marcado por igual.

E ambos, nessa manhã, jaziam recobertos
de folhas que nenhum pisar enegrecera.
O primeiro deixei, oh, para um outro dia!
E, intuindo que um caminho outro caminho gera,
duvidei se algum dia eu voltaria.

Isto eu hei de contar mais tarde, num suspiro,
nalgum tempo ou lugar desta jornada extensa:
a estrada divergiu naquele bosque – e eu
segui pela que mais ínvia me pareceu,
e foi o que fez toda a diferença.

Tradução: Renato Suttana

Polinizando Ideias: Saramago e A Caverna de Platão 

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Corria célere o ano de 1922. O pai chega ao cartório para registrar seu filho recém-nascido. Naturalmente o tabelião lhe pergunta qual nome dará ao seu menino. O pai lhe responde “José de Sousa”, que também é seu próprio nome. O tabelião pensa “Mas que falta de imaginação” e nada diz.

Passam-se sete anos e o menino José vai para a escola que lhe exige sua certidão de nascimento. Descobre então, atônito, que seu nome não é a simples repetição do nome de seu pai, mas sim chama-se José de Sousa Saramago. O tabelião inconformado com o triste destino do menino, acrescentou-lhe a alcunha pela qual a família do Sr. José de Sousa, um pobre camponês, era conhecida. Saramago, é nome de uma planta herbácea, que nascia espontaneamente nos campos da província do Ribatejo, em Portugal e que 76 anos depois, incorporou o significado do primeiro e único (até o momento) escritor em língua portuguesa a ganhar o Nobel de Literatura.

O pequeno aluno mostrou-se brilhante, mas aos 15 anos precisou parar de ir ao Liceu e passou para a escola técnica em busca de uma profissão que pudesse auxiliar nas despesas da família. O ofício escolhido foi o de serralheiro mecânico. O inusitado é que foi na escola técnica que ele encontrou os livros, pois além das disciplinas técnicas havia aulas de francês, português e literatura. E foi nos livros didáticos de literatura, que descobriu a poesia. Somente aos 19 anos pode comprar um livro e com dinheiro emprestado de um amigo. A biblioteca pública de Lisboa passou a ser sua companheira nas noites após o trabalho de serralheiro em uma oficina mecânica, e sua curiosidade e vontade o guiavam nas escolhas de suas leituras. Aos 25 anos, já casado e pai de sua única filha, Violante, que nascera naquele ano, publicou seu primeiro livro que intitulou A Viúva, mas foi publicado como Terra do Pecado. Somente 19 anos depois, em 1966, teve outro romance publicado que se chamou Os Poemas Possíveis.

Muitos livros vieram depois desse, mas queremos dedicar algumas poucas linhas a um de seus livros, publicado no ano 2000, que se chama A Caverna. Trata-se de uma versão moderna do mito de Platão. Platão colocou seus prisioneiros mitológicos em uma caverna de onde tinham uma visão do mundo apenas por meio de sombras projetadas de pessoas e estátuas do mundo exterior, e concluíram que as sombras é que eram a verdade e quando um deles conseguiu fugir e voltou contando do mundo como ele realmente era, foi morto, pois ninguém queria sair do “conforto” de um mundo conhecido, apesar de muito pior que o real. Saramago instala seus personagens como “prisioneiros” em um edifício – o Centro – de onde ninguém sai, pois tudo o que é necessário lá está. Ali as pessoas moram, trabalham, comem e se divertem sem ver a luz do sol ou da lua.

Tanto Platão quanto Saramago nos chamam a refletir sobre o ser humano e seu próprio pensamento, que pode aprisionar em mundos paralelos, cruéis e pouco sensíveis e a suportar situações e pessoas que distorcem a realidade. É sempre bom lembrar que o ambiente de trabalho, no qual se despende tanto tempo de vida, não precisa ser um ambiente de tortura ou de tristeza, mas pode e deve, ser um ambiente de respeito, criatividade e realização para todos.

Foto: Divulgação

Polinizando Ideias: O Vendedor de Passados

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O autor angolano José Eduardo Agualusa, traz neste livro de apenas 200 páginas uma estimulante reflexão sobre a verdade e a interação entre um homem que vende passados e seu inusitado interlocutor.

A epígrafe do livro já faz pensar, pois é uma citação do escritor argentino Jorge Luís Borges: “Se tivesse de nascer outra vez escolheria algo totalmente diferente. Gostaria de ser norueguês. Talvez persa. Uruguaio não, porque seria como mudar de bairro.”

A leitura tem um ritmo ágil e os breves capítulos vão deixando atrás de si uma história tramada nos tecidos da vida humana. A revolução, que acabou com o domínio português em Angola e abriu caminho para uma tortuosa guerra civil que durou de 1975 a 2002, está levemente pincelada no ir e vir dos personagens, nos seus encontros, desencontros, sofrimentos e reflexões.

O autor reflete sobre a máxima de Martin Luther King: “Eu tive um sonho”. Ele diz que King deveria ter dito: “Eu fiz um sonho”.

Fazer um sonho. Talvez seja esse o motivo maior, embora não o único, de recomendarmos esta leitura aqui, no Polinizando Ideias. Se ideias forem realmente fortalecidas na mente, a ponto de fazer sonhos tornarem-se realidade, é possível que as empresas, as pessoas e o planeta possam ter uma vida melhor. Sem verdades construídas sobre molenga base de mentiras, mas sobre sólidas e concretas ações de transformação.

Livro: O vendedor de passados
Autor: José Eduardo Agualusa
Editora: Gryphus-RJ

Café com a Oficina: A leitura pode revelar um tesouro escondido

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Os benefícios da leitura são aclamados em prosa e verso a cada dia, desde que o homem inventou a escrita, e um aspecto interessante destes benefícios, que é o de aumentar o poder pessoal, foi trazido à luz pela reflexão de um ex-presidiário americano, Nick Yarris, que foi inocentado após 23 anos de prisão.

Sua pena de morte por matar uma jovem foi anulada, quando os avanços das técnicas de análise do DNA puderam provar que ele era inocente e estava injustamente na prisão.

Ele relata que, em seus primeiros anos de confinamento, sentia-se tão desesperado que dava cabeçadas na parede com raiva e desespero e queria morrer. Foi preso com apenas 20 anos e com baixíssima educação básica, o que fez com que não pudesse ajudar a si mesmo, reagindo sempre com palavrões e com falta de clareza. Segundo sua análise, por não ter educação, por não saber se expressar, além da espera pela morte em uma cela solitária pela morte, ele sofreu agressões físicas e morais.

Tudo começou a mudar quando um carcereiro se apiedou dele e não apenas lhe emprestou alguns livros, mas o ensinou a como ler. Yarris diz que, a partir daí, deixou de ser amargo e passou a se educar. Acabou usando o tempo na prisão para melhorar sua educação, seu vocabulário e seu domínio da língua. Nos anos em que ficou preso leu 10.000 livros.

Ele foi tema de um documentário que se chama Fear of 13 (“Medo do 13”). O nome do documentário vem de uma das palavras que aprendeu com a leitura em seu projeto pessoal de saber mais na prisão, é a palavra triscaidecafobia – medo irracional do número 13. Hoje mora na Inglaterra, escreveu dois livros de memórias e dá palestras falando sobre a importância da leitura e educação no empoderamento dos jovens e de como a passagem pelo sistema carcerário o ajudou a ser uma pessoa melhor. Ele diz que o tesouro que levou da prisão foi o belíssimo conhecimento que adquiriu sobre ele mesmo e uma educação maravilhosa.

O líder Nelson Mandela, também relatou o quanto a leitura o tornou capaz de conhecer aqueles que eram seus inimigos de então, os africaners (brancos que dominavam seu país de maioria negra) para tornar-se o presidente de todos, brancos e negros da África do Sul. Em seus 27 anos de prisão (sua condenação era de prisão perpétua) ele aprendeu a língua, leu seus livros, refletiu sobre sua poesia, para finalmente triunfar e fazer história.

A leitura contribui para aumentar a compreensão do mundo, para entender pessoas de diferentes personalidades e capacidades e para ampliar as análises sobre as situações complexas do cotidiano. E, mais que tudo, para que cada um de nós entenda melhor a si mesmo, como fez Nick Yarris descobrindo possibilidades que nem mesmo imaginava existirem dentro de si.